27.11.04

experimento #1

minhas mãos estão tingidas
magenta; azul marinho;
rosa.
leves riscos pretos cortam o meu braço
o cabelo espalhado na testa
movimentos circulares
ondas

(orifício)


vejo eu, vejo você
a linha, o desenho


20.11.04

Entrou na casa por volta das 2 horas da manhã.
Tudo parecia silencioso, até o cão não latiu. Marco já estava em sono profundo, vendo Bia, rindo Bia, lambendo Bia.
Abriu a porta do quarto. Apreciava o corpo, iluminado pela luz enfraquecida do abajur. Quis tocar o rosto, mas pensou.
Num outro instante (mais dedicada) viu um sorriso terno se completando.

Marco sonhava.
Então se despiu, vestiu uma seda,
deitou.
Antes de apagar a luz, olhou mais uma vez para o homem.

Pele macia, cabelos envolvidos.
Fechou os olhos,
não quis pensar em mais nada.

15.11.04

posso simular,
ser outra pessoa

*fingir ser eu mesma

assim, não sentirei solidão
nesses dias sem sol, sem chuva

*temperamento azul-rosado
Ouço Cat Power
Meu corpo pende para o lado em busca dessa voz
Romântica

13.11.04

só me recordo do mar
o resto ficou manchado
poeirinha fina 

daqui, a vista fica mais embaçada

deixa eu ver...
é simpático sim,
como não!?


***

(versão esquecida no fundo de uma gaveta)

da fotografia só me recordo do mar
o resto ficou manchado
lágrimas e borra de café
aqui a poeira toma conta
mas ele é simpático,
como não?!

amei sim,
no more.

caberia o mundo dentro do meu quarto?
pelo vidro atravessam:
raios alaranjados
a voz doce
*
nesta tarde
o infinito é mesmo possível?
vontade de dançar
não ligar para o tempo
às vezes paro num canto qualquer
a admirar
pessoas, gestos,
bocas
olhares

headphones - para ana luiza

genius to fall asleep to your tape last night
so warm
sounds go through the muscles
these abstract wordless movements
they start off cells that haven't been touched
before
These cells are virgins
waking up slowly

my headphones
they saved my life

your tape
it lulled me to
sleep

nothing will be the same

I'm fast asleep

I like this resonance
it elevates me
I don't recognize myself
this is very interesting

my headphones
they saved
my life
your tape
it lulled me to sleep

I'm fast asleep now
I'm fast

asleep

my headphones
they saved my life
your tape
it lulled me to
sleep

(björk - post)

10.11.04

crônica

o que mais me intriga na escola de direito é aquele sinal. me faz lembrar o primário, em que um barulho de sirene anunciava o término do recreio ou o fim da aula.
vejo rapazes em seus ternos bem comportados, e moças, cada uma exibindo seu corte.
o anjo exterminador ?
na cantina, uns caras jogam truco.
há um cheiro insuportável de macarrão na chapa.
alguém come ruidosamente.
(embrulho no estômago)
desço as escadas, atravesso o prédio.
placas de metal exibem nomes de formandos. são como lápides.
(ou) o sonho de eternidade.
entro no jardim central.
contemplando um bem-te-vi, percebo que o lugar não está completamente perdido.

7.11.04

(para Lélia)

Clara, Mariana, Luiza, Catarina
Todas amigas de infância

Clara casou-se com Virgílio
Mariana descobriu Sara
Luiza mudou-se para Lisboa,
(manda presentes e cartão postal)
Catarina, deitada na grama,
A árvore das palavras

vez em quando ela se esquiva
a contemplar o pé carregado de amoras,
a hortelã, que se alastra pelo canteiro,
orquídeas, bailarinas, com suas saias de babado,
que enfeitam o jardim da casa
onde vive com os pais
a noite – enorme
tudo dorme
menos teu nome

-- que tudo se foda,
disse ela,
e se fodeu toda

amar é um elo
entre o azul
e o amarelo

sossegue coração
ainda não é agora
a confusão prossegue
sonhos afora
calma calma
logo mais a gente goza
perto do osso
a carne é mais gostosa

você está tão longe
que às vezes penso
que nem existo

nem fale em amor
que amor é isto

(Paulo Leminski)
monologo
na falta do que dizer invento uma situação
se ela não corresponde,
reinvento a vida
assim falo todos os dias
com o coração virado para o oriente (possível?)
penso em você, sentado no escritório
nas prateleiras pessoas se misturam
o olho pisca
a boca (em Ó) anuncia o fim da tarde
– estamos todos exaustos. alguém mencionou?
antes de ir pra cama,
ajeita os livros
(numa sensação de que tudo está ali)
um copo de leite, rosquinhas de açúcar
a luz se apaga

seus sonhos
*incompreensíveis

6.11.04

Sonho amarelo

Sabia que dali não poderia mais voltar.
Busquei meu amuleto. Uma espécie de girino amarrado em uma cordinha preta.
Recuperei ânimo, dei risada. Entreguei-me ao calor e aos afagos imaginados.
A mão tingida de um tom azul-meio-verde.
Lá fora, o sol desfaz a poesia.

2.11.04

Aventuras subjetivas de Madame Mimi

– "Olha! Temos amiguinhos".
Estávamos no Brasil 41 quando Mi viu dois cachorros se aproximando da calçada repleta de pessoas sentadas a suas mesas, tomando cerveja e caipirinha, comendo torresmo ou carne de sol com mandioca.
– "Tipo, tô afim de ir logo dançar".

Mi, já no seu quarto copo de cerveja, doida para ir à festa onde rolaria samba, black, funk, eletrônicos e Tom Zé.
No final da noite, me trouxeram (Mi e o namorado). Entrou para beber um copo d’água. Apagou no sofá. Só se deu conta de si com o sol invadindo a sala. Levantou, procurou seu quarto e achou tudo diferente. Teria sonhado? Acordou. Percebeu que não dormira na sua varanda. Foi ao banheiro, lavou o rosto.

– "Hora de ir para casa".
Pensou.
Lá fora, olhou pro céu, que estava azul-azul, sentiu no rosto aquele sol que repicava as folhas das árvores com um dourado quase abstrato.
– "Gente! Vamos pra uma cachoeira? Hoje tá com cara de cachoeira".

O namorado de Mi, que também apagou no sofá, não disse que sim, nem disse não. Somente olhou de lado, com uma cara de quem queria uma chuveirada gelada, dessas de trincar osso, cair na cama e dormir.
*À tarde, foram jogar futebol.