7.8.05

O marido ri na sala.
Ela tenta se concentrar no texto que precisa entregar até o final da próxima semana.
O marido dá uma gargalhada.
Ela
inveja.
O marido salta da cadeira.
Ela tenta entender como o autor constrói aquela narrativa oscilante.
De repente está na guerra colonial de Angola, lutando por uma causa que desconhece... a defender seu país sem ter sequer tido a chance de escolher se queria estar ali.
uma perna pelos ares cai ao seu lado...

podia jurar que era um tronco de árvore a sangrar...
A perna do soldado a faz lembrar da caixa de brinquedos.
Dos pedaços de bonecas. Dos olhos vazados da Guigui que insistia naquele sorriso de covinhas, da cabeça amassada da Fofolete e da Suzi, ou seja, do braço mastigado da Suzi.
A perna ainda é o soldado?
De volta ao acampamento, vê o médico desesperado com a chegada do primeiro morto...
Ele sai da enfermaria e não se importa em dizer:
“Está a dormir a sesta”.
No lado direito, os girassóis exibem, entre a fumaça, o seu bailarico diário.
O estourar de bombas a faz pensar nos foguetes de fim de ano. Como é lindo ver o céu exibir cascatas que oscilam entre o azul e o amarelo...
Feliz 2...
Quando percebe,
já se passaram horas...
o marido está no quarto a tomar chá, ouvir o rádio,
numa serenidade que anuncia o fim do dia...
amanhã, segunda-feira.
Depois da guerra,
providencia um banho quente,
para relaxar os ombros enrijecidos...
acalmar os dedos melancólicos.

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