24.8.05

querida A. R.,
hoje completa um ano.
desci no centro e comprei entradas para uma peça de teatro (Antígona).
saindo do Palácio das Artes quis entrar no Parque Municipal. de fora da grade me pareceu um lugar tranqüilo para dedicar um minuto a você.
me enganei.
definitivamente não somos cosmopolitas... e de enxeridos ficamos olhando os outros: suas roupas, feições etc.
nem disfarçadamente,
queremos devorar o outro antes que ele nos devore.
ninguém suporta a solidão alheia e logo metem o olho intimidativo.
tentei perceber os patos que correm sobre as águas verdes do lago central...
mas um desejo incontrolado de fugir daquelas pessoas me fez desistir do gesto...
caminhei depressa pela rampa em S e antes de atingir a estrada principal:
uma linda gata branca sai de dentro das árvores...
não vejo muitos gatos soltos na rua ultimamente,
somente os gatos da vizinha do prédio ao lado
(que ficam tomando sol na janela ao final da tarde)
talvez o número de cercas elétricas esteja impedindo os gatos urbanos de circularem entre quintais, ruas e passeios.
mas a gata branca me trouxe você...
era realmente linda
tinha o olhar imperativo, como o seu...
desfilava como uma dama em seu casaco de pele legítimo...
igual ao dia em que me pegou de madrugada em casa e me levou ao hospital,
nunca esquecerei desse dia... seria a última pessoa que eu teria visto se morresse na emergência do Semper, que fica em frente a uma das entradas do parque.
não fui a última pessoa a lhe ver...