20.3.14

A releitura de um texto do antropólogo e cineasta Ruben Caixeta, "Jean Rouch: o sonho mais forte que a morte" (revista Devires v.2, n. 1, 2004), me levou ao filme "A pirâmide humana" de 1961, em que o tema do racismo é mais uma vez abordado por Rouch. O cineasta convida alguns alunos de um colégio na cidade Abidjan (Costa do Marfim), no contexto da independência africana, para examinar o que pode ser a relação entre brancos e negros através da realização de um filme, numa tentativa de mostrar o que “pode ser daqui pra frente”. Cito: “nesse projeto revela-se tanto uma postura política do autor quanto uma estética do documentário: se quisermos olhar para a realidade, temos que olhar para a frente, onde ela se encontra, não somente para o mundo das coisas ‘dadas’ ou ‘construídas’, mas para o mundo da imaginação e do invisível”. Creio que os corpos dançantes desses jovens, impressos pela câmera de Rouch, talvez falem de uma imaginação agora um tanto perdida, em tempos de dilaceramento de corpos que antes dançavam, e do invisível que só no instante da morte deve ser compreendido.

Scène de danse, La Pyramide Humaine:





7.3.14

O avião cortando as nuvens
Tive uma ideia
Não uma ideia justa
Mas justo uma ideia
Nessa tela de projeção que é o céu,
as nuvens,
recortes de branco e cinza,
3D?

Vejo a ideia.
Daí abro o livro* que me acompanha: 

- “Ensaiar para ver, ‘ver não isto ou aquilo, mas somente ver se há algo a ver’”; 

- “Decompor para reencontrar a força do ver, para transformar de novo o ato de olhar num acontecimento, para ver se ainda conseguimos construir o sentido com as imagens”;

Pois voar para mim sempre foi uma aventura: 

- Câmera lenta/ efeito pintura:  “trata-se também de diminuir a velocidade como se pilota um avião, no olho”.

Na tela imaginária, pensei: se o avião cair, por motivo técnico ou um urubu preso à turbina, desacelero a velocidade do corpo em queda com/no pensamento? Perdi o medo da queda, o risco que nos acompanha, todos juntos ao mesmo tempo agora.

Da boca (e não mais da pedra) brota uma flor. As imagens se fundem, contundem e se dissolvem como ideias-nuvens. 



*citações de Philippe Dubois sobre Godard. 



para César e Oswaldo
para Carla e Raquel  
para o Leo e alunos