29.9.11


meu corpo
completamente entregue ao seu
ainda assim
nos despedimos na madrugada
interrompendo o fluir da nossa existência
eu sempre querendo mais e mais
toca a minha face lânguida
e diz vem!

28.9.11

e na vida, quando a gente quis,
foi bom o tempo das conversas ao vento
da troca de sorrisos
do meu
corpo sobre o seu
 
e a lua que sempre nos sorriu
alegrou as noites sim
sem prever um fim
meu bem

procuro um amor solene
um canto para me deitar
mas é preciso que a cama esfrie
antes de por outro no lugar

ou será apenas mais um
sem que eu possa
o poema endereçar

22.9.11

álvaro de campos

li seus versos pela manhã

neles encontrei um nome
para a solidão que devora os dias

três, quatro ruas apenas

da casa para o trabalho
do trabalho para o bar
do bar para a cama que o recebe

meu corpo tomado pelo seu

permanece insone 

escreve todas as noites sem fim
aguardando a hora de dormir
e não mais acordar

15.9.11

Biografia literária (ao querido Mangabeira e aos jovens leitores)


A minha biografia literária  sofre do mesmo mal que o da maioria dos jovens da minha época que não faziam parte (nem de longe) da paidéia aristocrática. A escola me fez ler todos os livros da Coleção vaga-lume e eu li até descobrir o poema "Ismália" de Alphonsus de Guimaraens, quando começava a perceber o mundo se abrindo na estante de casa. Meu pai consumia tudo que podia e nunca fez questão de nos apresentar ou impor a leitura. Mas reproduzia em voz alta o que sabia dos clássicos, dos manuais de medicina e das ficções científicas. Desde então passei a desenvolver a escuta e perceber cada dobra do corpo no ato da fala. Ele contava muitas histórias como se fossem aventuras dele. Daí passei a desconfiar de que não nos dizia toda a verdade. Precisava rapidamente conferir nos livros todo aquele emaranhado de histórias narradas pelo meu pai. Tornei-me uma leitora esquizofrênica, catando trechos de tudo que podia ler sem que ninguém percebesse, porque havia livros proibidos para minha idade,  incluindo gibis pornográficos mocados num cantinho onde a Barsa imperava.

Do poema “Ismália”, aos 13 anos, a Werther, na juventude. Tentei compreender o que é desejar duas coisas ao mesmo tempo e a impossibilidade de realização do desejo a não ser pelo fim trágico. Essa é a tensão das duas histórias. Quanto à de Goethe, meu pai advertia que o livro conduziu, na época de seu lançamento, ao suicídio de vários jovens comovidos com o sofrimento do pobre Werther. Percebi que era preciso ler com distanciamento, o contrário disso seria a loucura. Descobri que os poetas antecipavam as coisas pra gente
e que não precisávamos ser tão literais nas nossas ações. Nesse sentido, quando não era a vida a nos dizer, como leitores a gente também amadurecia à força.


É saudável nos distanciar das "verdades" do livro e compreender que a literatura lida com a ironia. Mas a maioria dos meus amigos que liam, liam pouco, ocupados com o eterno movimento da conquista, e não estavam interessados em desenvolver sobre assuntos tão complicados, a não ser como artifício de sedução. 

Por fim, descobri a física e, ao desdobrar um mapa do universo, vi que Ismália era uma gota no oceano e Werther um ser perdido no espaço. Encantei-me com as possibilidades de ler no céu o infinito que nos aguardava. Porém, ao invés de ir pra física, fui fazer letras, para apreender um pouco mais o infinito que há nos livros. 

Um amigo dizia que os poetas só amam aquilo que escrevem e que não se importam com os leitores. 

Glaura C.
Belo Horizonte, 15 de setembro de 2011

13.9.11

talvez siga o mesmo destino dos poetas
para não fugir à regra
despertar antes que adormeça

10.9.11

Morro como meu filho no ventre
porque é insuportável conviver com a dor

Morro como quem pede abrigo

querendo apenas uma cama para se deitar

Morro como todas morreram
para nascer num poema

Morro como despencam
as folhas das árvores
com a chegada do vento

Morro para que a alegria prevaleça
como a última lembrança

Morro deixando vestígios
de uma vida ordinária

Morro como morrem os pássaros
que caem dos ninhos

Morro como quem espera
o tempo das chuvas

Morro para que ninguém saiba

8.9.11

caro leitor,

este mês faz sete anos de publicações. quero agradecer sobretudo aos que sempre acompanharam este desembaraçar cotidiano e os cuidados do Eassis, meu editor e amigo querido.


recuperei um post de setembro de 2004 que pode funcionar como uma síntese do que aqui se pode encontrar:


chega pra cá,
que eu quero lhe dizer
palavras de amor.



abraço,

glaura.

6.9.11

Caiçara - CE

 

Nesse dia havia três cães a nos seguir. Vinham na trilha e remexiam carcaças, ossadas de animais que não identificávamos. Eles vinham como a gente vinha, também em três, atentos aos sons da mata e fugindo das formigas vermelhas que nos maltratavam os pés. O caminho não era longo. Abaixávamos no entrecruzar das árvores, para que os galhos não nos furassem a face.

O destino era a lagoa, onde pudemos desfrutar da água morna e cristalina, vendo a lua e o sol ao mesmo tempo. Os dedos rosa da aurora a nos encher de esperança quando tocam o infinito. 

















Fotos de Philipi Bandeira


5.9.11

posso ainda sentir
o calor do seu corpo
e o seu cheiro
na manhã que chega

depois de me possuir 

e me beijar o rosto
já quase sem forças
desfaleço

sem suspeitar

vamos transformando
a noite em dia

se ao menos deixasse entrar

saberia o quão amoroso
se faz um encontro

4.9.11

Se um dia for para você me tomar como sua mulher
Poderá ter quantas outras quiser
Em mim
e fora de casa

Eu saberei, meu querido

Quando você se sentir sozinho
É para meus braços

que retornará sorrindo
forumdoc.bh



1.9.11

por que me tortura tanto?
quando muito peço apenas um sorriso
amor solene
e por isso resiste
mesmo quando você vai embora
sem dizer até logo

por que negar?
se tudo é como um sonho
de quem espera para ver a moça passar
e ensaia, em frente ao espelho,
o momento certo
mas nunca é o bastante

por que nos torturar?
como o vento que agora faz curva
batendo portas e janelas
grita e ri alto o meu destino
sendo ingrato, eu sei,
como todos os homens
coração de pedra